sexta-feira, 1 de abril de 2011

Seu nome não está na lista



Quando a gente está desempregado, se submete a cada coisa!
Enfrenta cada parada maluca, só para conseguir um emprego...
Principalmente quando o dinheiro acaba e no desespero paramos de raciocinar direito.
Este é o pior momento na vida de um desempregado. É quando ele já não tem grana nem cabeça para participar de processos seletivos e mesmo assim teima em enfrentar mais um.
Assim também foi comigo!
Em uma dessas situações, quando eu já tinha mando currículos para tudo quanto é lugar, vaga anunciada em jornal, página de RH de empresa na internet, site de empregos, amigos e a sola do sapato já estava gasta de tanto bater de porta em porta nas empresas e de entregar currículos nos balcões de empresas de seleção de pessoal e nem me lembra mais para onde mandou, recebi uma ligação, no final da noite, me convocando para uma entrevista na manhã seguinte às 8:00h da manhã em uma recrutadora de Cajamar - SP.
Nesta hora eu me tornei uma máquina de "sim".
- Tem veículo próprio?
- Sim!
- Tem disponíbilidade para viagens?
- Sim!
- Conhece a empresa "X"?
- Sim!
- Gostaria de atuar como vendedor desta empresa?
- Sim!
- Pode estar aqui amanhã cedo para uma entrevista?
- Sim!
- Anote meu telefone.
- Sim!
- Procure por mim "fulana", quando chegar.
- Sim!
Ainda bem que ela não perguntou se eu estava preparado para dar a "bu...) porque no desespero eu também diria "Sim!".

Desligo o telefone e começo a pular de alegria!
Era a primeira entrevista em meses de envio de currículos.
Finalmente! Uhu! Finalmente!
Quando a adrenalina começa a baixar, vou tomando consciência de que, não tenho carro, não tenho dinheiro nem para ir de busão para lá, não sei como chegar e nem como chegar.
GPS ainda era coisa que só as empresas e ricos tinham e nesta época eu estava tinta na impressora, para imprimir o percurso do Google Maps.
Inicio uma longa e delicada negociação com a minha esposa que, nesta época também não estava empregada.
Juntamos nossos trocos, para eu poder por gasolina no carro dela e ter dinheiro para pedágios, estacionamento e um lanche.
Separo um kit entrevista, pego um bom e velho mapa rodoviário e vou dormir mais cedo, para estar logo ao amanhecer na estrada.
De Sorocaba-SP, onde moro, até Cajamar, são 106Km pelo caminho mais rápido que é de quase duas horas, percorrendo a Castelo Branco até Osasco e depois seguindo pela Anhanguera, de volta para Cajamar.
Beijos de boa sorte, dedos cruzados e lá vou eu, cantarolando pela estrada.
Chego, como havia planejado com 30 minutos de antecedência.
São 7:30h, penso em comer alguma coisa, mas desisto, para não me atrasar. Vou para a porta da empresa de seleção e... ela está fechada!
Volto para o carro, estrategicamente estacionado do outro lado da rua, e aguardo a chegada de algum funcionário.
9:00h e qualquer coisa mais, as portas se abrem, eu e mais alguns candidatos entramos em seguida e somos encaminhados para uma sala com várias cadeiras escolares.
Mais alguns (vários minutos e entra uma "entrevistadora" pedindo desculpas pelo atraso e justificando com algum papo, que não lembro bem mas, era algo sobre a pessoa que tinha que iniciado o processo de seleção não pode estar presente e ela continuaria a seleção.
Por sorte a entrevistadora resolve fazer uma conferência se todos os que deveriam estar presentes já chegaram.
Começa pelo canto direito dela perguntando:
- Qual o seu nome?
- Fulado de Tal
- Ok!
Aponta para o próximo que informa
- Sicrano
- Ok!
E assim a conferência prossegue, até chegar o meio da sala, onde estou e apontar para mim.
Informo:
- Márcio Richarde Eiras
- Como?
(isso não ta me cheirando bem. Penso eu)
- Márcio Richarde Eiras ... Richard com "E" no final e o Eiras é E, I, R, A, S,
- Seu nome não está na lista!
- Mas eu recebi uma ligação ontem, da Beltrana, falando para estar aqui!?
- Espere um pouco, vou conferir lá na recepção e já volto.
Enquanto isso, estou eu lá sentado, mantendo meu metabolismo perto do estado ALFA, e contando até mil de trás para frente, pulando os números primos, para manter a calma e não suar ou ficar vermelho e atrapalhar a entrevista.

Ela volta e informa que não conseguiu encontrar meu currículo, pergunta se tenho uma cópia.
Informa que como eu tenho uma cópia ela poderá prosseguir com a entrevista e pede para eu aguardar.
Respiro aliviado...Ufa!!!!
Essa não posso perder!
Ela chama o primeiro dos, acho que uns 8 ou 10 candidatos que estavam na sala, quando passam pela porta, tenho tempo de notar que ambos, entrevistadora e candidato, são muito altos, pelo menos muito mais altos do que eu.
Continuo procurando me distrair e ter só pensamentos positivos, quando não tendo mais o que fazer olhando somente para os meus dedos, começo a olhar para os outros candidatos.
Estar em uma sala com outros candidatos é realmente um exercício de auto controle.
Você quer matar eles, quer que eles sumam dali e tem que ficar fazendo cara de gente boa e amigo!
Continuo a vasculhar os candidatos e noto que todos, TODOS, tem mais de 1,75m.
Perfil típico de pessoas que as empresas gostam de contratar para o departamento de vendas, para ficar aquela conversa de cima para baixo com o cliente.
Nunca tive complexo por ser baixinho, mas, achei estranho eu não ter o nome na lista e ser justamente o menor entre todos.
Acho que estão levando o conceito de que os vendedores devem "tomar o mercado" muito a sério!

Chega finalmente a minha vez de ser entrevistado.
Caminho alinhado, para sala da entrevista, repassando mentalmente, todas as instruções de como devo me comportar.
A entrevista corre sem incidentes, o papo flui e as perguntas clássicas são efetuadas.
Nos despedimos, e ela reforça a promessa de que logo ligarão para informar o resultado.
Saio da empresa, sigo até o carro, entro, abro a minha pasta e pego outra cópia do meu currículo.
Olho para a foto e mato a charada.
No currículo está uma foto, que foi tirada por um fotógrafo que estava em posição ligeiramente mais baixa que eu, causando a impressão de que eu era mais alto que ele.

Não preciso dizer que nunca mais recebi uma ligação da empresa recrutadora?

Ligo o carro e saio, rezando para a gasolina não acabar na estrada.

Nenhum comentário:

Postar um comentário